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Critérios que influenciam a escolha do calçado do calçado infantil

WILBORN, Juliana ; CUNHA, Beatriz ; BOEIRA, Denise e WÜST, Eduardo


1 Instituto Brasileiro de Tecnologia do Couro, Calçado e Artefatos (IBTeC)

Resumo

Este artigo tem como objetivo uma pesquisa antropométrica realizada com crianças de 3 a 11 anos de idade, em um colégio de rede privada localizado na região metropolitana de Porto Alegre/ RS, onde foi aplicado um questionário diretamente aos pais dessas crianças com a finalidade de caracterizar o comportamento destes, referente aos cuidados com os pés dos filhos, bem como conhecer quais são os pontos mais relevantes na hora de efetuar a troca dos calçados destes jovens.


Palavras-chave: pesquisa antropométrica, crianças, pés, calçados


1. Introdução

Do nascimento até o final da adolescência, percebemos que os pés passam por diversas fases distintas de desenvolvimento. O desenvolvimento motor é um processo de mudanças que não ocorre de maneira igual para todos e, segundo Gallahue (2005), cada indivíduo tem um tempo peculiar para a aquisição e o desenvolvimento das habilidades motoras.


Sua evolução acontece de acordo com as necessidades infantis como, por exemplo, ficar em pé, equilibrar-se, caminhar, pular, correr, entre outros. O processo de desenvolvimento de uma criança compreende diversas vivências motoras, cognitivas e sociais até que alcance maturidade suficiente para que sua marcha possa ser biomecanicamente semelhante ao adulto (RÉ, A.H.N. 2011). Durante o desenvolvimento das crianças, ocorrem também modificações significativas das estruturas anatômicas como ossos, músculos e ligamentos relacionados aos pés. Observa-se que nos primeiros anos de vida, sua formação é basicamente composta por tecidos moles (músculos, tendões, gordura, vasos sanguíneos e nervos), mas à medida que acontece o desenvolvimento da criança, consequentemente ocorre o crescimento do pé e todas as cartilagens se ossificam, seguindo o processo normal de formação do osso (KAPANDJI. 2012). Por fim, este processo de ossificação será concluído por volta dos 14 ou 15 anos de idade.


Outro fator importante é que o pé atinge seu crescimento final antes do restante do corpo, e com o crescimento inicia-se a elevação do o arco longitudinal medial dos pés. De acordo com Abolarin (2011), quando a criança inicia a marcha, a planificação do pé se dá pela combinação do coxim gorduroso na região plantar e a hipermobilidade articular. Bertsch (2004) complementa afirmando que o coxim adiposo tem como finalidade a proteção da estrutura cartilaginosa dos ossos do tarso, e é absorvido durante os primeiros 4 ou 5 anos de vida.


Neste contexto, podemos classificar brevemente as mudanças que ocorrem de acordo com a idade e o que deve ser observado no calçado para que os pés se desenvolvam sem prejuízos:


- 0 aos 2 anos: neste período o pé é plano e robusto, o arco plantar, os ossos e os músculos do pé vão se formando gradativamente. A criança coloca todo o pé no chão para recuperar o equilíbrio e para evitar possível queda. Nesta fase, os pés têm muitos receptores sensoriais que lhes permitem processar informações e receber estímulos. O papel do calçado nesta fase é de proteção, permitir que os pés recebam os estímulos naturais e se adaptem a eles, como por exemplo, as irregularidades do solo. Devem ser leves e flexíveis não impedindo a mobilidade dos pés; para a região dos dedos, se indica que seja mais largo e arredondado, de modo que não os aperte e a região do calcanhar seja de uma densidade especifica, para proporcionar firmeza sem interferir na mobilidade.


- 2 aos 7 anos: aos poucos aprendem a subir, a descer e a caminhar em todas as direções. Os movimentos ganham mais precisão, em especial a motricidade. Neste período, ocorre desenvolvimento na musculatura do pé, contribuindo assim para a evolução dos arcos plantares. Nesta fase, o calçado deve oferecer leveza, flexibilidade e segurança, solado antiderrapante para acompanhar as atividades que são mais intensas nesta faixa etária (ex. correr, pular...).


- 7 aos 15 anos: a partir dos sete anos, o sistema ósseo e os músculos estão em pleno crescimento. As habilidades adquiridas até então são consolidadas e com o crescimento a criança ganha massa e os pés passam a ter um papel importante no amortecimento, ou seja, na sustentação do peso corporal. O ideal para acompanhar esta fase é um calçado que absorva os impactos, cuja palmilha permita a distribuição dos pontos de apoio do pé, oferecendo estímulos e sensações semelhantes ao andar descalço.

É muito importante ter como hábito observar os pés das crianças, pois em cada fase há aquisição de novas habilidades. A anatomia dos pés vai se modificando e o calçado precisa estar ajustado a este contexto. Nesse sentido Rosenbaum (2004) ressalta que os calçados não devem ser projetados somente conforme a demanda da moda, mas conforme as necessidades biomecânicas, garantindo que tenham um bom calce e conforto.


2. Metodologia

Este trabalho foi caracterizado como descritivo exploratório. Inicialmente, foram aplicados questionários para 80 crianças, com faixa etária entre 3 a 11 anos, de ambos os gêneros (47 meninas e 33 meninos), com a finalidade de ser respondido pelos pais das mesmas. O objetivo era descrever através do feedback dos pais as perguntas relacionadas ao comportamento quanto à compra de calçados dos filhos bem como a observância de suor nos pés, mau odor (chulé) e possíveis marcas/pressões ocasionadas pelos calçados.


3. Resultados e discussão

De acordo com a Figura 1, quando questionados sobre o que consideram mais importante ao comprar calçados para os seus filhos, observou-se que 69% dos pais priorizam o conforto. Este resultado compõe um cenário em que os pais se mostram atentos às necessidades e adaptações anatômicas dos pés, visto que o conforto contribui para proteção do sistema musculoesquelético, bem como saúde e bem-estar.

Figura 1: Fatores delimitantes na hora da compra do calçado


Ao longo dos anos, nota-se que ocorreram avanços tecnológicos no que se refere a materiais, processos e nos métodos de avaliação dos produtos, no entanto é fundamental focar na fase de desenvolvimento em que a criança se encontra e observar se o produto atende às necessidades infantis. Nesse sentido, os pais precisam estar muito atentos aos pés dos filhos, principalmente na fase de desenvolvimento, pelo fato do sistema musculoesquelético estar em evolução, por exemplo, o pé do bebê que apresenta estrutura não completamente ossificada, o que pode, através de um calçado desconfortável (apertado) ocasionar prejuízos futuros. Segundo Klein (2009), esses prejuízos podem ser deformidades do hálux (hálux valgo), deformidades nos dedos (dedos em garras), entre outros.


Seguindo esta linha, um questionamento relacionado a este trabalho foi a respeito das dificuldades de comprar calçados para os filhos, conforme Figura 2. Observou-se que 66% dos pais apresentam dificuldade em determinar a numeração dos calçados das crianças. Isso pode estar relacionado com a grande diversidade das marcas de calçados presentes no mercado e a não padronização das fôrmas utilizadas para a confecção dos produtos. Também observa-se que aproximadamente 34% dos pais relatam dificuldades em encontrar calçados devido a morfologia dos pés, bem como design do calçado.

Figura 2: Dificuldades na compra de calçados


No que se refere ao crescimento dos pés e assertividade da numeração dos calçados, observa-se nas Figuras 3a e b, respectivamente, que 70% dos pais realizaram pelo menos duas trocas de numeração do calçado no último ano. Observa-se ainda que, destes, 55% utilizam o método de pressionar o bico do calçado para identificar se o hálux está próximo da região anterior da biqueira.

Figura 3:

3a: Número de trocas de calçado no ano 3b:Motivo da troca


Outro questionamento realizado aos pais foi a verificação quanto ao preço do calçado infantil que estava classificado em valores baixo, justo e alto. A Figura 4 apresentou os resultados, onde 81% dos entrevistados consideram o calçado infantil um produto de valor elevado seguidos de 19% que acreditam que o preço é justo. Nenhum dos entrevistados julgou o preço dos calçados como baixo. Acredita-se que esses resultados podem estar relacionados às tecnologias embarcadas que alguns calçados apresentam.

Figura 4: Classificação do preço de calçados infantis


Durante a atividade diária, o suor é uma função normal do sistema de termorregulação do organismo, contribuindo para a dissipação do calor excessivo dos pés. Quanto menor a criança, maior o número de glândulas sudoríparas encontradas em uma pequena região dos pés. Neste sentido, quando questionados, 61% dos pais responderam que os pés dos filhos produzem suor e, destes, 59% confirmaram a presença de odor, conforme as Figuras 5 e 6, respectivamente.

Figura 5: Presenta de suor nos pés Figura 6: Presença de mau odor


Irzmánska (2016) enfatiza que temperaturas mais elevadas e umidade no interior do calçado, além da sensação de desconforto, podem contribuir para o crescimento de microorganismos (fungos e bactérias) o que origina o mau odor. Se a criança apresentar umidade excessiva nos pés e não houver preocupação médica (hiperidrose), é importante que a meia e a forração interna do calçado absorvam essa umidade, mantendo assim os pés secos e levemente aquecidos, contribuindo para o conforto.


Por fim, questionou-se a respeito de presença de marcas e pressões que mais são encontradas nos pés das crianças quando utilizam calçados fechados. Observa-se na Figura 7 que várias regiões foram apontadas, sendo a região do calcanhar a mais mencionada (35%), seguida do peito do pé (20%). Esses achados podem estar relacionados com materiais rígidos, acabamentos e/ou enfeites utilizados no calçado, diante disto, Matos (2014) salienta que o coeficiente de atrito entre o material têxtil e a pele assume especial importância na definição do conforto sensorial, dada a sua relação com forças de corte que se estabelecem entre as duas superfícies (pele e material têxtil) que, se excessivas, poderão em última análise conduzir à formação de lesões na pele.

Figura 7: Regiões com presença de marcas e pressões


1. Conclusão

Através deste trabalho, conclui-se acerca da importância de desenvolver calçados com atributos de conforto e funcionalidade, atendendo as necessidades e exigências do desenvolvimento da criança. Para atender a este atributo, é importante que as medidas do produto venham ao encontro da morfologia dos pés, desta forma proporcionando maior assertividade do calce e reduzindo possíveis reclamações. Diante disso, espera-se que pais estejam atentos quanto ao calçado infantil, de maneira que possam identificar o produto que permita o crescimento adequado dos pés e que sejam escolhidos de acordo com a idade e necessidades motoras e fisiológicas da criança, de modo a não comprometer seu desenvolvimento e sua segurança.


Bibliografia

1. ABOLARIN, T. O. et al. Relationship between selected anthropometric variables and prevalence of flatfoot among urban and rural school children in south west Nigeria. Nigerian quarterly journal of hospital medicine, v. 21, n. 2, p. 135-140, jun. 2011. PMID 21913511. Disponível em: //pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21913511/>. Acesso em: 16 jun. 2020.

2. BERTSCH, C. et al. Evaluation of early walking patterns from plantar pressure distribution measurements. First year results of 42 children. Gait & Posture, v. 19, n. 3, p. 235-242, jun. 2004. DOI 1 0.1016/S0966- 6362(03)00064-X. Disponível em: <https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15125912/>. Acesso em: 17 jun. 2020.

3. GALLAHUE, D.; OZMUN, J. C. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. 3. ed. São Paulo: Phorte, 2005.

4. Irzmanska, E.. (2016). THE MICROCLIMATE IN PROTECTIVE FIRE FIGHTER FOOTWEAR: FOOT TEMPERATURE AND AIR TEMPERATURE AND RELATIVE HUMIDITY. Autex Research Journal. 16. 75-79.

5. KAPANDJI, A. Anatomia funcional: fisiologia do sistema motor. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. 320 p. v. 6. ISBN 8530300572.

6. KLEIN, C. et al. Increased hallux angle in children and its association with insufficient length of footwear: A community based cross-sectional study. BMC Musculoskeletal Disorders, v. 10, n. 159, dez. 2009. DOI://doi. org/10.1186/1471-2474-10-159. Disponível em: <https://rdcu.be/b5B3G>. Acesso em: 17 jun. 2020.

7. Matos. Joaquim F. Vasconcelos, Desenvolvimento de Materiais têxteis com propriedades antimicrobianas para revestimento de calçado, Universidade do Minho, 2014, pag. 79-80.

8. RÉ, A. H. N. Crescimento, maturação e desenvolvimento na infância e adolescência: Implicações para o esporte. Motricidade, Vila Real, v. 7, ed. 3, p. 55-67, jul. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.mec.pt/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S1646107X2011000300008&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 16 jun. 2020.

9. UNGER, H.; ROSENBAUM, D. Gender-specific differences of the foot during the first year of walking. Foot & ankle international, v. 25, n. 8, p. 582-587, ago. 2004. DOI 10.1177/107110070402500812. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/15363381/>. Acesso em: 16 jun. 2020.

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