Foto Bertex | Luiz Vieira
Por Luís Vieira
A cadeia têxtil global tem se destacado na implantação de tecnologias transversais provenientes de diversas áreas do conhecimento, como ciência dos materiais, nanotecnologia, soluções que reduzem o impacto ecológico, impressão 3D, realidade aumentada e inteligência artificial, dentre outras. Essa integração é fundamental para impactar positivamente tanto a produção quanto a experiência do consumidor final, refletindo um compromisso do setor com inovação, sustentabilidade e personalização.
Com 24,3 mil unidades produtivas formais em todo o País, o segmento têxtil é composto por uma indústria diversificada e se consolida como um setor de grande importância para a economia brasileira - tanto em termos de produção, quanto exportação e geração de empregos -, se configurando ainda como um dos maiores produtores mundiais.
Dados divulgados pela Associação Brasileira das Indústrias Têxteis (Abit), em fevereiro de 2024, com base no relatório IEMI - Inteligência de Mercado 2023, mostram que o faturamento da cadeia Têxtil e de Confecção é de R$ 193,2 bilhões (2022). Outro estudo, realizado pelo Ministério da Economia, aponta que o segmento exportou em 2023 US$ 956 milhões.
O Brasil tem a maior cadeia têxtil completa de todo o Ocidente, a qual gera 1,33 milhão de empregados formais e produziu, somente em 2022, 8,07 bilhões de peças. Com tamanha performance, o setor de confecção é o 2º maior empregador da indústria de transformação nacional, perdendo apenas para alimentos (PIA - 2021; empresas com 5 ou mais pessoas ocupadas) e está posicionado entre os cinco maiores produtores e consumidores de denim do mundo e entre os quatro maiores produtores de malhas do planeta.
Tecnologias recentes que impactam no setor têxtil global
Os avanços em nanotecnologia e ciência dos materiais têm permitido inovações no setor têxtil, estendendo o uso de fibras e tecidos para aplicações técnicas avançadas. A integração dessas tecnologias tem levado à diversificação dos usos têxteis com novas funcionalidades, resultando nos chamados têxteis técnicos, que se destacam por suas propriedades funcionais e desempenho, sendo considerados indutores de inovação capazes de beneficiar toda a cadeia. Esses avanços impactam no conforto e na segurança do consumidor em vários aspectos. Um exemplo é o desenvolvimento de roupas esportivas de alta performance. Utilizando fibras tecnológicas ou impregnadas com nanomateriais, elas oferecem melhor respirabilidade, controle de umidade e propriedades antimicrobianas, proporcionando maior conforto e desempenho aos atletas. Outros exemplos incluem tecidos com filtros UV, antivirais e biodegradáveis, que se adaptam às condições climáticas ou são capazes de gerar energia por meio do movimento ou da luz solar. Além de serem mais práticos, esses tecidos melhoram o bem-estar dos usuários e abrem novas possibilidades para o design de moda. Tecidos que podem mudar de cor, controlar a temperatura do corpo ou até mesmo monitorar a saúde do usuário são alguns exemplos que oferecem uma experiência mais interativa e personalizada ao usuário final.
Com o aumento da conscientização ambiental, a cadeia têxtil tem focado em tecnologias que reduzem o impacto na natureza, como o desenvolvimento de materiais sustentáveis e processos de produção mais ecológicos. Por exemplo, o uso de técnicas de tingimento que consomem menos água e energia, bem como a reciclagem de polímeros, que envolve a conversão de resíduos têxteis, muitas vezes compostos por uma mistura de fibras naturais e sintéticas, em novos produtos. Para o consumidor final, isso significa acesso a produtos mais sustentáveis e com menor pegada ambiental. As roupas feitas de materiais reciclados estão se tornando cada vez mais comuns, oferecendo uma alternativa consciente sem comprometer a qualidade ou o estilo.
A personalização é uma grande tendência, com tecnologias como a impressão 3D e a manufatura digital, permitindo que os consumidores tenham produtos feitos sob medida. Isso pode levar a uma experiência de consumo mais individualizada do cliente, ao mesmo tempo que contribui para a economia circular, reduzindo o excesso de produção e o desperdício. Já os avanços em Realidade Aumentada e Inteligência Artificial levam à melhora da experiência de compra, permitindo que os consumidores visualizem como as roupas ficariam em seus corpos antes de fazer uma compra, o que pode reduzir as taxas de retorno e aumentar a satisfação dos clientes.
Segundo a Abit, que tem como presidente Ricardo Steinbruch, as maiores inovações do setor têxtil são desenvolvidas principalmente pela cadeia de fornecimento, incluindo fornecedores de polímeros, fibras, aditivos e nanomateriais. Ou seja, as indústrias de base são responsáveis por criar os avanços tecnológicos fundamentais que os fabricantes têxteis utilizam para aprimorar seus produtos. Os fabricantes têxteis têm um papel crucial na aplicação e adaptação dessas inovações para criar produtos finais com propriedades específicas e melhoradas. Eles implementam as novas tecnologias desenvolvidas pela cadeia de fornecimento e ajustam-nas às necessidades específicas do mercado têxtil, focando em aspectos como conforto, desempenho, eficiência energética e sustentabilidade.
Nos últimos anos, diversas inovações aprimoram a funcionalidade em tecidos e não tecidos, tendo como resultado aumento da segurança, conforto e performance dos usuários, mostrando a capacidade da cadeia têxtil em adaptar e aplicar avanços tecnológicos para atender às necessidades específicas de cada setor.
Vestimenta militar
No setor militar, a tecnologia aplicada aos tecidos inclui o desenvolvimento de materiais que oferecem camuflagem avançada, propriedades de proteção balística e resistência a condições extremas. A Gore Military Fabrics, por exemplo, introduziu o Gore-Tex Pyrad, uma tecnologia que oferece proteção contra chamas e calor extremo, mantendo a respirabilidade e a impermeabilidade, essencial para ambientes adversos. Esta tecnologia também proporciona durabilidade e resistência à abrasão em condições extremas, oferecendo proteção e conforto para os soldados em operações rigorosas.
Roupa esportiva
No âmbito esportivo, a Nike introduziu a tecnologia Nike AeroAdapt, que ajusta automaticamente a ventilação para manter a temperatura corporal ideal. Esta inovação oferece resfriamento ativo e máxima respirabilidade, melhorando a gestão da umidade e a regulação térmica, otimizando o desempenho do atleta ao prevenir o superaquecimento e a hipotermia.
Moda casual
Foto uniqlo.com
Para o uso casual, a Uniqlo apresentou o Heattech, uma tecnologia que inclui propriedades antibacterianas e antiodor, proporcionando aquecimento e leveza ideais para o dia a dia. Este tecido converte a umidade corporal em calor, mantendo o usuário aquecido sem sobrecarregar, e oferece leveza e flexibilidade para maior conforto.
Além disso, a moda casual tem visto a introdução de tecidos inteligentes que mudam de cor conforme a temperatura do ambiente e oferecem funcionalidades como conectividade Bluetooth e monitoramento da saúde, como os desenvolvidos pela Delfim, que incluem tecnologias como Peach Touch e Dry-fit.
EPIs
Foto dupont.com.au
Em relação aos equipamentos de proteção individual (EPIs), a DuPont desenvolveu o DuPont Tyvek, que oferece uma barreira contra partículas, líquidos e produtos químicos. Este material é leve e flexível, permitindo maior mobilidade, e apresenta alta durabilidade e resistência, crucial para ambientes de trabalho perigosos, garantindo proteção contínua para os trabalhadores.
Hospitalar
No campo hospitalar, a Ahlstrom-Munksjö introduziu o Reliance SMS, um material que proporciona barreira contra bactérias e vírus, sendo leve e respirável, essencial para longos períodos de uso. É um tecido que apresenta alta resistência à tração além de oferecer proteção eficiente contra fluidos, tornando-se ideal para o ambiente hospitalar, garantindo segurança e conforto aos pacientes e profissionais de saúde.
Infantil
Para o público infantil, a Carter’s lançou a linha Little Planet Organic Cotton, feita de algodão orgânico livre de substâncias químicas nocivas. Este tecido é extremamente suave e hipoalergênico, ideal para a pele sensível dos bebês, e mantém alta durabilidade e resistência à lavagem, preservando a maciez e o conforto.
Foto ahlstrom.com
Segmento de TNT investe US$ 15 milhões em alta tecnologia
Com os principais polos de produção localizados em estados como São Paulo, Santa Catarina, Bahia, Paraná e Rio Grande do Sul, cujas produções são destinadas para os mais diversos fins, como o setor têxtil, calçadista, de EPIs e automobilístico, a indústria de não tecidos (TNT) também é significativa no Brasil. São cerca de 450 empresas atuantes (dados de 2021), que geram mais de 18 mil empregos diretos. Conforme estimativas da Associação Brasileira das Indústrias de Não Tecidos e Tecidos Técnicos (Abint), em 2022 foram produzidas 387 mil toneladas de não tecidos no Brasil. Em 2023, o Brasil exportou 20 mil toneladas desses materiais, e até abril de 2024, 7,6 mil toneladas.
Desde 2020, o setor investiu mais de R$ 500 milhões em aumento de capacidade instalada. Anualmente, o segmento investe cerca de US$ 15 milhões em atualizações, reposições e manutenção de máquinas e equipamentos de grande porte e alta tecnologia.
O presidente da (Abint), Mateus Mesquita Inacio, lembra que os não tecidos estão presentes como insumo direto ou indireto de produtos que fazem parte do nosso cotidiano, como fraldas, absorventes, lenços umedecidos, vestimenta de proteção hospitalar e para a indústria, automóveis, vestuário, construção civil, filtração e até mesmo produtos agrícolas. Em cada aplicação, os não tecidos se destacam por seus benefícios sociais, econômicos e ambientais.
Do ponto de vista social, produtos fabricados com não tecidos como máscaras e roupas de proteção exercem um papel fundamental na segurança de profissionais da saúde em ambientes hospitalares e da população em geral durante surtos pandêmicos ou em ambientes de risco. Absorventes femininos, por sua vez, contribuem para o acesso confortável de mulheres à educação e ao mercado de trabalho. Por serem produzidos de forma mais eficiente que seus principais substitutos, não tecidos contribuem para a redução do custo de fabricação de bens de consumo essenciais como fraldas infantis e para incontinência, tornando-os mais acessíveis para a população.
Do ponto de vista econômico, a indústria de não tecidos é altamente formalizada, gerando empregos de qualidade e contribuindo com o desenvolvimento das regiões onde está presente.
Avanços sob o ponto de vista ambiental
Diversas aplicações dos não tecidos estão relacionadas com a proteção do meio ambiente, como nos casos de produtos médicos descartáveis, que reduzem significativamente o consumo de água e uso de produtos químicos (posteriormente descartados no meio ambiente) para a desinfecção de suas alternativas reutilizáveis; barreiras de adsorção, que ajudam a conter a contaminação da natureza em acidentes com derrame de óleo e outros químicos; geotêxteis, utilizados na construção civil para evitar a contaminação do solo, como no caso de aterros sanitários, e também como proteção de encostas e barreiras.
Ainda que atualmente existam não tecidos recicláveis, compostáveis e biodegradáveis, o seu fim de vida está intimamente ligado à aplicação nos produtos acabados. “Apesar do grande debate em relação ao uso de produtos descartáveis, análises de ciclo de vida mostram, em diversos casos, que os seus impactos ambientais são inferiores ou semelhantes ao de suas alternativas reutilizáveis. Isso pode ser observado, por exemplo, no estudo de ciclo de vida de não tecidos destinados ao setor médico-hospitalar comissionado pela Abint”, contextualiza o presidente da instituição.
Conclusão semelhante pode ser vista na análise realizada pela Lifecycle Initiative da Unep - análise do ciclo de vida realizado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente -, onde os benefícios relacionados ao uso de fraldas reutilizáveis só podem ser observados em condições específicas de lavagem e secagem. “A crescente conscientização da população em relação ao impacto de seus hábitos de consumo para o planeta tem aumentado cada vez mais a pressão em relação às práticas sociais, ambientais e de governança das empresas. Em todos os aspectos, econômico, ambiental, os não tecidos contribuem para uma melhor experiência do consumidor”, reforça Mateus.
Esforço conjunto
Há um grande trabalho conjunto entre cliente e fornecedor para atender as necessidades dos segmentos onde atuam e agregar melhorias de desempenho e performance aos produtos desenvolvidos. Fabricantes de máquinas, equipamentos, matérias-primas e insumos trabalham para que se tenha processos produtivos Segmento de TNT investe US$ 15 milhões em alta tecnologia eficientes, com menor geração de CO 2, por exemplo, que garantam as ferramentas necessárias para a indústria de TNT avançar no desenvolvimento de produtos. Nos últimos anos o foco desse elo da cadeia está em lançamentos ligados a sustentabilidade, saúde e segurança/proteção, sejam matérias-primas de fontes renováveis, matérias-primas recicladas, tratamentos que adicionam propriedades especiais aos não tecidos, tanto para o aumento da sua suavidade quanto para proporcionar performance especial, como antimicrobianos.
Nesse sentido, nos últimos anos, várias inovações tecnológicas foram lançadas pelo setor, com aplicações nos mais variados nichos de mercado, trazendo benefícios em segurança, conforto e performance. O segmento militar, por exemplo se beneficia com avanços em coletes a prova de bala e blindagem de veículos; o setor de EPIs viu o aumento de soluções para aventais e macacões resistentes a produtos químicos e respiradores PFF (filtrante responsável por não deixar os contaminantes do ambiente entrarem em contato com o sistema respiratório do usuário); a linha hospitalar, além de contar com paramentação odonto-médico-hospitalar, pode contar com a ampla oferta de compressas, campos cirúrgicos, lenços umedecidos antissépticos para higienização das mãos e superfícies, compressas estéreis com elevada absorção e utilizadas para primeiros socorros e tratamento, curativos, protetores oftálmicos, base de eletrodos, vestuário para procedimentos e exames, embalagens para esterilização; já para o segmento infantil, são desenvolvidos artigos como fraldas, lenços umedecidos.
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