O Projeto de Lei (PL 3140/2020) apresentado na Câmara dos Deputados permite que empresas que registrem prejuízos durante a calamidade retifiquem suas declarações de renda de 2018 e de 2019 e, assim, possam obter restituições de Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL). A medida permite, na prática, que o valor devolvido dos tributos sirva como uma injeção de recursos no caixa das empresas para que possam enfrentar a crise econômica.
O projeto alcança as empresas inscritas no regime de lucro real, mas abre a possibilidade para aquelas inscritas no lucro presumido alterarem o seu regime fiscal para que possam optar pela alternativa. Atualmente, essa compensação só pode ser feita em anos posteriores ao do prejuízo registrado e o limite dessa espécie de crédito é de 30%, calculado sobre o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL). Segundo a proposta, o Fisco será ressarcido em tributos pagos a mais quando a empresa voltar a ter lucro.
O texto, que aguarda despacho do presidente Rodrigo Maia para tramitar na Casa, visa a socorrer os negócios afetados pela crise econômica causada pela pandemia do Covid-19 e tem como foco a preservação de empregos. Segundo estimativa do autor do PL 3140/2020, deputado Luis Miranda (DEM-DF), esse aproveitamento retroativo do prejuízo fiscal pode beneficiar diretamente 146 mil empresas, de todos os setores da economia. “Nesse momento em que a gente não pode mais perder emprego e ter empresas quebrando no País, esse PL é importantíssimo. Além das pequenas e médias empresas que estão declarando que vão quebrar, porque não possuem capital de giro e o sistema online não foi satisfatório, a gente não pode ter a indústria nacional travada”, avalia o deputado.
Para entender melhor o que o projeto sugere e como isso vai funcionar, o advogado tributarista Thales Falek aponta que é preciso antes entender a Lei nº 9.065, em vigência há 25 anos. “A legislação trouxe essa possibilidade [de compensação] para equilibrar os períodos negativos que uma empresa tem durante um ano com os períodos positivos que ela tem em anos posteriores”, revela. Dentro de um ano-calendário, explica o especialista, uma empresa passa por uma série de eventos que a levam a contabilizá-los, para que, no fim do ano, possa recolher o IRPJ e a CSLL, impostos federais pagos ao governo. “Como o próprio nome diz, esse imposto e essa contribuição social incidem sobre renda e sobre lucro. Se em determinado período a empresa só registra prejuízo, se as despesas durante o ano são maiores que as receitas, significa que ela não deverá apurar nem a contribuição social nem imposto de renda naquele determinado período”, esclarece Thales.
No ano seguinte, caso a empresa aumente seu patrimônio, a legislação atual permite que seja compensado o resultado negativo anterior com esse saldo positivo. “É basicamente você compensar um débito que você tem com um crédito que é gerado posteriormente”, exemplifica.
O deputado Luis Miranda ainda calcula quanto a aprovação dessa medida injetaria no fluxo de caixa das empresas e defende que a adequação da lei enquanto durar o estado de calamidade pública vai evitar que mais empresas decretem falência. “Com base na nossa proposta, a ideia é preservar todos os empregos que já existiam antes da pandemia, ou seja, dar fôlego para que as empresas possam continuar as atividades sem demissões”, reforça.
O que muda
A Lei nº 9.065/1995 permite que sejam compensados esse prejuízo fiscal e essa base de cálculo negativa com anos-calendário posteriores, em que uma determinada empresa contabiliza lucro, renda e tenha que pagar os impostos devidos sobre o lucro líquido.
“Hoje, a atual legislação traz um limite de compensação de 30% sobre o lucro real que a empresa teve”, pontua Thales Falek. O lucro real a que se refere o advogado é um regime de tributação no qual o cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido é feito com base no lucro real da empresa, ou seja, receitas menos despesas.
Se aprovado, o PL 3140/20 abre caminho para que a compensação seja integral e utilize os “créditos” dos dois últimos anos. “O projeto traz a excepcionalidade de você compensar com os anos-calendário de 2018 e 2019, que são anos anteriores. Além disso, a empresa pode compensar 100% desses valores”, indica.
O advogado tributarista vê a iniciativa do deputado Luis Miranda como positiva e enfatiza que a mudança nas regras é uma tentativa emergencial de frear os prejuízos econômicos de empresários e seus colaboradores. Thales Falek aconselha, inclusive, que o assunto seja incluído na pauta da reforma tributária. “É um tema espinhoso, que gera discussão tanto em tribunais administrativos quanto no Judiciário. O Supremo Tribunal Federal (STF), inclusive, já debateu sobre a constitucionalidade dos 30%”, recorda.
A discussão que deve ser levantada, segundo ele, é se essa “trava” de 30% se aplicaria também a empresas que venham a ser extintas por incorporação, fusão ou cisão empresarial. “Devido a essas nuances e aos debates não encerrados, há necessidade de uma discussão mais aprofundada na reforma tributária, até pela sensibilidade e relevância do tema”, avalia. A proposta não traz previsão explícita se essas empresas também serão contempladas com a medida.
O autor do PL, deputado Luis Miranda, menciona como isso vai funcionar. “No caso de empresas que passaram por reorganização societária ou reestruturação, como em fusões, aquisições, incorporações ou cisões, a empresa sucessora que é responsável pelos tributos federais no prazo prescricional é quem retificará as declarações de anos anteriores, visando à compensação dos prejuízos da pandemia”, crava o parlamentar.
Para Thales Falek, os efeitos econômicos do texto apresentado pelo deputado Luís Miranda devem gerar um cenário de redução de custos tributários e de ativo para as empresas, visto que a maioria delas deve fechar o ano no vermelho.
“Em um período de pandemia e de pós-pandemia, em que empresas estão com alto custo de folha de salário, fornecedores e atos regulatórios, a possibilidade de mitigar o custo tributário e gerar ativo para servir de capital de giro é importante para diminuir os efeitos econômicos causados pelo coronavírus”, pondera.
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